CAPÍTULO 10

Chegar em casa foi um imenso alívio para Raymara. A menina olhou pela janela da frente da casa, disfarçadamente, e não avistou a mãe. Retirou novamente a sandália dos pés e abriu a porta com muito cuidado. Entrou bem devagar, esticou o pescoço, tentando ver se alguém estava na cozinha e, ao perceber que não, seguiu na direção da escada.

Do topo da escada, apertou o passo até chegar ao seu quarto. Respirou aliviada assim que entrou e fechou a porta. Caso a mãe perguntasse algo, diria que ficou ali desde que saiu do sofá. De repente ouviu a porta do quarto do irmão se abrir.

Raymara decidiu sair do seu próprio quarto e, então, viu sua mãe descendo as escadas. Aparentemente, havia acabado de sair de onde o irmão estava. A menina decidiu vê-lo.

Ela abriu a porta e encontrou o irmão de pé, olhando pela janela. Desta vez, nenhum gato forçava a entrada. Raymara aproximou-se.

– Quero te contar um segredo, mas você não pode contar para a mamãe –, disse a menina.

– Já tenho meus próprios segredos –, respondeu Geovane.

– É sobre o Fábio.

Geovane, então, olhou interessado para a menina.

– Você sabe algo sobre onde ele está? Ou o que aconteceu com ele?

– Não, não é isso.

O menino voltou a olhar pela janela. Pareceu perder o interesse.

– Geovane, é algo que eu sei que você vai se interessar, mas eu preciso que prometa que não vai contar. É sério.

– Tudo bem –, respondeu o menino, ainda sem muito interesse no assunto.

– Eu pedi à mamãe para ir à casa do Fábio e ela não deixou... mas eu fui assim mesmo.
O menino olhou para a irmã sem acreditar no que havia feito. Ela continuou.

– Eu consegui entrar no quarto dele e... o sumiço dele é muito estranho, sabe?
Geovane agarrou a irmã pelos braços, próximo ao ombro, olhou no fundo dos olhos da garota e, então perguntou:

– O que foi que você viu? O que pode ter acontecido ao Fábio?

– Eu não vi muito. O quarto está lacrado com uma fita. Algumas vizinhas estavam falando bobagens na saída mas, segundo elas, a polícia ainda não sabe de nada.

– E no quarto, Raymara?

– Pois é, foi no quarto que eu achei a coisa toda muito estranha. A cama dele estava arrumada. Eu não acho que, ao entrar no quarto e ver que o filho não estava lá, a mãe tenha se preocupado em arrumar a cama. Eu pensei que...

– Ele não dormiu lá –, disse Geovane, completando a fala da irmã.

– Isso. Tem mais. Tinha um copo de água pela metade. Ele já tinha bebido um pouco, mas ainda tinha água. Mas, de tudo, o que mais me chamou a atenção foi o caderno.

– O que tinha lá?

– Bom... ele estava escrevendo uma frase e... eu não lembro bem do que estava escrito mas... a última palavra era “Igre”.

– “Igre”? Que palavra é essa?

– Acho que não é uma palavra. A letra “e” estava puxada, como se ele fosse escrever outra palavra. Eu lembro que, na hora, quando li a frase inteira, pensei em “Igreja”. O que eu não entendi foi ele não concluir a palavra. Parece que foi levado às pressas.

A frase da irmã deixou Geovane ainda mais preocupado.

– Então, foi mesmo um sequestro?

– É a única coisa que eu posso imaginar. O quarto dele é no segundo andar, mas a janela estava aberta.

Geovane lembrou que já havia conversado com o amigo sobre janelas abertas. Enquanto Fábio deixava sua janela aberta para ventilar o quarto, ele mantinha a dele fechada para impedir a entrada de gatos, em especial, Nino.

– Mas ele não fez nenhum barulho ao ser levado? Será que estava acordado? Será que o fizeram dormir? Como o desceram até o chão sem ninguém notar?

– Geovane, eu não sei. Isso é tudo que vi. A polícia está tentando descobrir onde ele está. Quer ir lá comigo, amanhã?

– Se mamãe deixar, sim.

Raymara virou-se e saiu do quarto. Geovane olhou para seu caderno e a pilha de livros sobre a escrivaninha e lembrou-se do trabalho de história. Sabia que não conseguiria fazê-lo enquanto estivesse pensando no amigo. Atirou-se, então, na cama. Uma série de memórias dele e Fábio voltaram a sua mente. Parecia que aquele dia nunca teria fim.


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