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CAPÍTULO 6

Após tomar banho, Geovane desceu para almoçar com a família. Enquanto Raymara agia como se nada estivesse acontecendo, a mãe seguia fria. Ele não pretendia contar a ela o que havia feito, então, a única saída era aguentar e esperar até que ela esquecesse o assunto. Depois do almoço, o garoto voltou para o seu quarto. Lá espalhou os livros sobre a escrivaninha e iniciou o trabalho de história. O livro de capa preta também estava lá, aberto na página em que estavam os últimos nomes. A tarde rendeu. O menino conseguiu avançar bem com o trabalho. Naquele ritmo, deveria concluí-lo ainda na manhã de domingo. Ele só foi interrompido duas vezes, ambas por Nino, tentando entrar pela janela. Já acostumado às investidas do animal, o garoto a mantinha sempre fechada. O jantar foi um déjà vu do almoço. A irmã conversando e a mãe com seu comportamento frio. Geovane ficou feliz de voltar ao quarto ao fim da refeição. Ele retomou o trabalho. Cansado e com sono, o garoto já não consegu

CAPÍTULO 5

Raymara subiu até seu quarto, onde guardou seu material escolar e trocou o uniforme por uma roupa mais confortável. Ao contrário do irmão, não tinha qualquer atividade escolar para fazer, o que lhe deixava com todo o fim de semana livre. Mas, antes de começar a aproveitá-lo, algo a incomodava. Afinal, o que Geovane estava escondendo? Ela saiu do seu quarto e sentou-se no alto da escada. De lá, poderia ver o irmão, assim que entrasse pela porta da frente. Além disso, também era impossível que ele chegasse até o quarto sem passar por ela. Na cozinha, a mãe também aguardava a chegada do filho. Por implicância de irmãos, Raymara não ficava exatamente triste quando o garoto levava uma bronca ou ficava de castigo. Aquele, no entanto, não era o caso. Ela foi a primeira a ver quando o irmão entrou em casa com um livro de capa preta nas mãos. Ele logo percebeu a mochila jogada sobre o sofá, a pegou, e enfiou o livro lá dentro. Antes de coloca-la nas costas para subir as escadas, su

CAPÍTULO 4

O caminho até a casa de Fábio foi um verdadeiro monólogo. O silêncio de Geovane contrastava com a tagarelice do amigo. Ele falou sobre a brincadeira com Raymara, sobre a última surra que levou da mãe, sobre a vez que ficou mais de uma hora escondido no banheiro da escola para não ser visto pelos valentões e, é claro, sobre o trabalho de história. Quando finalmente chegaram ao seu destino, Fábio virou-se para se despedir do amigo e, para sua surpresa, Geovane, finalmente falou. – Fábio, preciso te mostrar uma coisa. Fábio olhou sério para o amigo. Seu comportamento foi estranho por todo o caminho mas, agora, ele estava ainda pior. Geovane enfiou a mão por dentro da caminha, na parte de traz. De lá, retirou um livro com capa dura preta. Nela, não havia nada escrito, a não ser uma espécie de relevo, que o garoto não conseguiu identificar o que era. Foi Geovane quem quebrou o silêncio. – Eu peguei esse livro naquela pilha que estava na mesa, na biblioteca. Na sala

CAPÍTULO 3

O caminho até a casa dos irmãos foi diferente para o trio. Fábio e Raymara se divertiam, jogando adedonha, com nome de cantores. A garota estava vencendo, o que, aparentemente, não incomodava o amigo. Ele sorria a cada novo nome que ela dizia, enquanto procurava seus próprios nomes. – Você é muito ruim nesse jogo, Fábio –, dizia a garota, enquanto vencia mais uma rodada. Um pouco para trás, Geovane estava submerso em seus próprios pensamentos. Desde que saiu da biblioteca, o menino pouco falou, limitando-se a dar respostas breves quando lhe faziam alguma pergunta. Depois de alguns minutos de caminhada, ele ergueu a cabeça e avistou sua casa, assim como uma visita indesejada logo na entrada: era Nino, o gato da vizinha.  Geovane não nutria nenhum ódio oculto por animais, mas era alérgico a gatos. Certa vez, teve que ir ao hospital, após um gato entrar, no meio da noite, pela janela do seu quarto e deitar-se em sua cama. A companhia felina enquanto dormia desencadeou uma cri

CAPÍTULO 2

A biblioteca era quase no caminho das casas de todos eles, embora tivessem que fazer um pequeno desvio de apenas uma quadra. Assim como Geovane, Fábio não tinha feito o trabalho e queria aproveitar para também pegar alguns livros. Os três chegaram à biblioteca municipal e deram de cara com a recepcionista dormindo. Ela já era uma senhora de idade e não era a primeira vez que a encontraram naquela situação. Geovane logo pensou em quão ‘emocionante’ deveria ser a profissão dela. Naquele momento, os três eram os únicos na biblioteca além, é claro, dos funcionários. Ficar sentada por horas naquela cadeira, sem ninguém passando, deveria ser, de fato, entediante. Por fim, decidiram não interrompê-la e rumaram para dentro. Era importante sair logo, afinal, um imenso trabalho os aguardava. Raymara, que apenas acompanhava o irmão, foi explorar o local, enquanto os garotos reviravam os livros na seção de história. Embora o acervo não fosse grande, eles estavam certos que encontrariam o

CAPÍTULO 1

A aula era de matemática, mas, na cabeça de Geovane, os pensamentos estavam todos voltados para a disciplina de história. Era sexta-feira e, assim que o sinal batesse, começaria mais um fim de semana. Mas ele não estava empolgado como de costume. Na segunda-feira teria que entregar um imenso trabalho sobre a Idade Média. Embora o prazo inicial fosse de um mês, ele havia deixado para fazê-lo na última hora. Não era hábito do garoto, de apenas dez anos, deixar as atividades escolares para depois. Pelo contrário. Normalmente fazia logo e libertava-se da responsabilidade. Como sua mãe costumava dizer: os estudos primeiro. Ele já havia traçado seu plano. Ao sair da escola, passaria direto pela biblioteca municipal, pegaria alguns livros, e então iria para casa. Teria de ser responsável para concluir o monstruoso trabalho a tempo. Na frente da sala, a professora continuava explicando sobre expressões numéricas. Nada que o amedrontasse. Ele estava mais preocupado com a saída da e

PRÓLOGO

A tarde parecia igual a todas as outras. A neve cobria toda a planície do pequeno povoado Inuit . Havia panelas no fogo, preparando a comida dos moradores do vilarejo. Cerca de trinta pessoas viviam ali. Mas a aparente normalidade logo foi rompida. Algo estava fora do lugar. Não era o latido insistente dos cães nos cercados. Responsáveis por puxar os trenós, eles permaneciam presos e bem alimentados enquanto não eram chamados para uma nova viagem. Naquele dia, contudo, latiam aterrorizados. A neve branca se estendia até onde os olhos podiam enxergar. Todos os botes estavam na beira do lago. Aparentemente, ninguém havia saído da comunidade. Mas algo ainda estava fora do lugar. No meio da paisagem predominantemente branca, havia apenas um som que se sobressaía aos latidos caninos. Era um choro. O choro de uma criança. Por sinal, o único ser humano no local. As lágrimas quentes do menino, que aparentava cerca de seis anos, faziam pequenos buracos no gelo frio. O pranto de